Sofia Martins Santos |
10/04/2016
O pedido de ajuda
ao Fundo Monetário Internacional (FMI) pelas autoridades angolanas surge na
sequência da forte quebra do preço do petróleo, matéria-prima de que dependem
cerca de 80% das receitas de Angola. O ministro das Finanças angolano garantiu
que não se trata de um resgate, mas esta assistência deverá ter consequências.
As empresas estão optimistas e admitem que não existiam alternativas, mas há
também há riscos no horizonte.
Tiago Bossa
Dionisio, economista chefe da empresa de serviços financeiros Eaglestone,
explica ao SOL que “o programa de apoio do FMI deverá ter um impacto positivo
dado que a possível entrada de dinheiro ajudará a regularizar as contas e os
salários em atraso em diversos setores onde operam as empresas portuguesas”.
Além disso, “a
aceleração do processo de diversificação da economia Angolana poderá trazer
novas oportunidades para as empresas e os trabalhadores portugueses. No
entanto, enquanto que a possível entrada de dinheiro para saldar dívidas e
pagar salários poderá ter efeitos no curto-prazo acreditamos que o impacto do
aumento da diversificação económica irá demorar algum tempo até se fazer
sentir”.
A verdade é que a
situação das empresas portuguesas que operam em Angola está cada vez mais
difícil. E a perspetiva de uma degradação adicional do ambiente de negócios
assusta os empresários que viam o país africano como prioritário. As dívidas às
empresas portuguesas estavam a aumentar, apesar de não existirem ainda valores
concretos. Ao SOL, o presidente da Associação de Industriais da Construção
Civil e Obras Públicas (AICCOPN) não escondia já em janeiro deste ano que
situação era cada vez mais difícil. “Em primeiro, há um atraso nos pagamentos e
depois existe ainda um outro grande problema que é o facto de os pagamentos
estarem a ser feitos em kwanzas”, explicou Manuel Reis Campos, acrescentando
não existir nenhum número concreto sobre a dívida que existe às empresas
portuguesas.
Importância de
Angola
Agora, perante o
pedido de assistência que foi feito por parte do Governo ao FMI, o presidente
da AICCOPN sublinha que, independentemente do impacto positivo ou negativo,
Angola deixou há muito de ter alternativas para resolver a grave crise
económica e cambial que atravessa. “Este pedido de ajuda é feito porque Angola
está numa situação limite. Não há divisas e os trabalhadores não conseguem
manter os vínculos laborais que tinham porque os ordenados não estão a ser
pagos. Há muitos com ordenados em atraso. Por isso, esta medida mostra uma
vontade de resolver a situação e isso é bom. É uma medida que vai ajudar a
definir melhor o futuro das nossas empresas. Como estava não podia continuar”.
Reis Campos
sublinha que Angola é um mercado importante para Portugal. Em 2014,
representava para as empresas portuguesas cerca de dois mil milhões de euros,
sendo o quarto maior mercado de exportação de Portugal. “As empresas
portuguesas querem continuar a contar com aquele mercado. Havia uma situação de
desgaste permanente para os empresários e este pedido é agora um sinal de
esperança”, explica, acrescentando que em Angola “temos cerca de 10 mil
empresas e quase 130 mil trabalhadores. É um grande volume de negócios”.
Também para Paulo
Varela, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola (CCIPA),
apesar dos riscos a longo prazo, esta solução pode ser muito importante para as
empresas portuguesas: “O acordo com o FMI poderá contribuir para a
estabilização da situação cambial evitando maiores dificuldades no curto prazo,
o que também beneficiará as empresas portuguesas”.
Impacto na
economia nacional
Contudo, o pedido
ao FMI tem também riscos de médio prazo. De acordo com uma análise do banco de
investimento Haitong, empresas como BCP, BPI, Galp Energia, Mota-Engil, Nos e
Ibersol, que são cotadas, podem ser afetadas por este recurso ao FMI. “Esta
decisão deverá ter algum impacto na economia portuguesa já que as exportações
para aquele país deverão ser travadas e algumas das empresas cotadas ou têm as
suas operações no país ou têm o Estado angolano direta ou indiretamente na
estrutura de capital”, refere o relatório.
Entre os
trabalhadores portugueses em Angola há também receios com um eventual corte nos
gastos públicos com infraestruturas. “A solução não passa pelo FMI. Não tenho
dúvidas de que a situação vai piorar”, explica Albano Ribeiro, presidente do
Sindicato da Construção de Portugal, que antecipa que a desvalorização salarial
faça com que o número de pessoas a sair do país continue a aumentar. “Se cortarem
nos salários e nas obras, o que vai acontecer é que os que ainda lá estão e vão
tentando aguentar vão regressar também. E falamos de milhares”.
sofia.santos@sol.pt
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