Sabe qual é o
custo de um litro de petróleo?
Um barril de
petróleo contém, mais coisa menos coisa, 159 litros. Se considerarmos o preço
atual do barril de petróleo, de 38 dólares em Nova Iorque, então, o custo por litro
é de apenas 24 cêntimos.
A água
engarrafada é mais cara do que o petróleo, pelo que a este preço, a
classificação do petróleo como “ouro negro” parece atualmente desajustada! Está
barato mas nem sempre foi assim.
Entre 2000 e 2008
o preço do petróleo disparou de 25 para 150 dólares por barril, impulsionado
pelo aumento da procura em várias economias, com destaque para a chinesa, e
pelo corte de produção decidido pela Organização dos Países Exportadores de
Petróleo (OPEP). Depois, na sequência da recessão global provocada pela crise
financeira iniciada com a falência do banco de investimento Lehman Brothers, o
preço desceu para 40 dólares por barril.
Em 2009, com a recuperação económica,
o preço do petróleo regressou para os 100 dólares.Até 2013 o preço andou sempre
acima dessa barreira, até que em 2014 iniciou uma queda livre até aos dias de
hoje.
Esta é a história
sumária da evolução do preço do petróleo nos últimos anos, a mais importante
matéria-prima do nosso planeta. Para ilustrar a forte queda do preço do
petróleo desde 2014, apresentamos-lhe no gráfico abaixo a evolução de um
instrumento financeiro que replica o preço do petróleo, o certificado sobre o
Brent, do qual falaremos no segundo texto desta newsletter, como forma de
investir no petróleo:
Millennium bcp
sobre o Contrato Futuro do ICE Brent Crude
Fonte: Millennium
bcp, Bloomberg
Um pouco mais de
informação sobre o petróleo
Nas notícias
publicadas sobre o preço do petróleo, é frequente encontrarmos a informação de
que o West Texas Intermediate (WTI) se aplica sobretudo ao mercado
norte-americano, e o Brent à Europa. Mas há muitas outras diferenças entre os
dois tipos de petróleo, que procuramos sintetizar na tabela seguinte.
Características
do contrato
WTI
Brent
Tipo de petróleo
subjacente
Baixa viscosidade e teor de enxofre (0,24%), o
que o leva a ser denominado de light (leve) e sweet (doce), sendo de mais fácil
refinação do que o petróleo do Médio Oriente
De qualidade ligeiramente inferior ao WTI,
apresentando um teor de enxofre de 0,37%, embora seja igualmente classificado
como light e sweet
Localização do petróleo
Entrega em Cushing, pequena localidade do
Oklahoma (EUA), onde são armazenados stocks de petróleo proveniente do Golfo do
México
Petróleo proveniente dos campos do Mar do Norte:
Brent, Forties, Oseberg e Ekofisk (BFOE)
Abrangência geográfica do consumo
É consumido essencialmente nos EUA, não sendo
exportado
É consumido principalmente na Europa, mas o
seu preço serve de referência a cerca de 70% das entregas físicas em todo o
mundo, com destaque para a Ásia, dado que é facilmente transportável por via
marítima
Negociação em mercado de futuros
Negociado na New York Mercantile Exchange
(NYMEX), em Nova Iorque, desde 1983
Negociado na International Petroleum Exchange
(actual ICE Futures Europe), em Londres, desde 1988
Liquidez do contrato de futuros
É o contrato de matérias-primas mais negociado
em todo o mundo, chegando a ter 1,5 milhões de contratos ativos a cada momento
Embora esteja a recuperar terreno nos últimos
anos, continua a ser menos negociado do que o WTI
Tradicionalmente
o preço do WTI e do Brent andam lado a lado, com o WTI a negociar a prémio
sobre o Brent devido à sua qualidade mais elevada, não sendo no entanto
atualmente o caso, pois sucede precisamente o inverso.
Porque é que os preços estão tão baixos?
Não que a
resposta seja linear, mas como para qualquer outro bem transacionável
livremente, o preço é definido pelo equilíbrio entre a procura e a oferta. Por
isso, a debilidade do preço só pode advir da fraqueza da procura, do excesso da
oferta, ou claro, de ambas em simultâneo.
Decidimos por
isso procurar dados que nos permitissem aferir da evolução da procura e da
oferta. No gráfico abaixo apresentamos-lhe a evolução do consumo e produção de
petróleo a nível mundial nos últimos anos.
logo: Consumo vs
Produção de petróleo a nível mundial
Fonte: EIA– U.S. Energy Information
Administration
Infelizmente os
dados de 2015 ainda não estão disponíveis, no entanto acreditamos que a
tendência de 2014 se manteve, com a produção de petróleo a superar o consumo, e
consequentemente, a pressionar a queda do preço do petróleo.
O tema não está
tanto do lado da procura, que tem vindo a aumentar consistentemente ao longo
dos últimos anos, em linha com o crescimento económico mundial, mas sim de um
aumento da oferta, com um incremento da produção muito significativo.
Analisando em
detalhe os dados da produção de petróleo por país, podemos confirmar que o
grande aumento da produção se deu nos Estados Unidos. Se em 2010 este país
produzia cerca de 9,7 milhões de barris de petróleo diariamente, esse número
aumentou em 2014 para os 14 milhões de barris, correspondente a uma variação
positiva próxima dos 45%. Esta forte subida da produção foi sustentada em
particular no shale oil, uma forma de extração de petróleo inovadora que
permitiu a um país industrializado como os Estados Unidos, fortemente
dependente do consumo de petróleo, tornar-se praticamente autossuficiente. Já
este ano, com o levantamento das sanções económicas ao Irão que permitirão a
este país exportar novamente petróleo, o preço do barril de petróleo quebrou
durante alguns dias a barreira dos 30 dólares, atingindo mínimos de 12 anos,
pressionado novamente por um aumento da oferta no mercado.
Os países
produtores de petróleo e o dilema do prisioneiro
Naturalmente que
preços do petróleo tão deprimidos não favorecem os países exportadores de
petróleo, que assim vêm diminuídas as suas receitas. A solução está no entanto
nas suas próprias mãos. Se cada um dos principais países reduzir a sua
produção, certamente que os preços voltam a subir e todos ficam melhor, mas
para já não parece haver consenso para que tal seja feito. Na ausência de
consenso ninguém quer dar o primeiro passo, sujeitando-se a ver reduzidas as
suas receitas por força da quebra da produção sem que esta seja compensada com
a subida do preço do petróleo, que só poderia suceder se todos decidissem
cortar a sua produção.
Adicionalmente
parece também haver para já o interesse de alguns dos maiores produtores de petróleo
em manter o preço baixo. Na verdade o custo de exploração do petróleo flutua
bastante de geografia para geografia. Se na Arábia Saudita o custo de
exploração do petróleo não deverá ultrapassar os 20 dólares por barril, na
Rússia, Estados Unidos, Brasil ou México o custo é bem mais alto, podendo
variar entre os 40 e os 70 dólares por barril. Tal significa que aos preços
atuais muita da exploração de petróleo é feita com prejuízo, o que não será
sustentável no longo prazo. Por isso, a manterem-se os preços atuais por um
período longo de tempo, a oferta diminuirá por força da extinção de
explorações, e em última instância, das respetivas empresas exploradoras. É a
lei natural da concorrência.
Os mercados
acionistas e o preço do petróleo
Sendo o petróleo
a principal matéria-prima do nosso planeta, não há empresa que de alguma forma
não tenha dependência do petróleo, maior ou menor, consoante o setor de
atividade. Da mesma forma que todos nós enquanto consumidores de gasolina ou
gasóleo apreciamos amplamente a queda do preço destes combustíveis na hora de
atestar o depósito do carro, todas as empresas beneficiam da queda do preço do
petróleo. Esse efeito positivo fez-se sentir nos mercados de ações no início da
queda do preço do petróleo em junho de 2014, tal como durante grande parte do
ano de 2015.
No entanto, desde
o final do ano passado e início deste ano que a correlação entre a queda do
petróleo e a queda dos mercados tem sido grande. Um movimento menos intuitivo
dado o racional exposto no parágrafo anterior que aponta a queda do preço de
petróleo como algo benéfico.
Aparentemente tal se deve ao facto do preço do
petróleo a 30 dólares estar demasiado baixo ao ponto de colocar em risco o
setor da energia. A falência massiva de empresas no setor teria efeitos
devastadores na economia. Acresce que preços do petróleo demasiado baixos
colocam também em risco países cuja economia depende fortemente da produção de
petróleo, traduzindo-se na prática numa redução do seu poder de compra e
consequentemente da procura de bens e serviços. Tal facto teria como
consequência o abrandamento do crescimento económico mundial. Desta forma se
compreende que nos últimos tempos, as quedas do preço do petróleo tenham sido
uma alavanca para a queda dos mercados acionistas.
Em conclusão....
Enquanto não
forem desenvolvidas energias alternativas capazes de substituir o petróleo em
escala e em custo, o reinado do “ouro negro” continuará a prevalecer.
A que preços?
Bom, o preço
atual dificilmente se poderá manter no longo prazo, pois está baixo demais para
ser sustentável na indústria energética tal como a conhecemos hoje. Seja por
efeito da redução da oferta pela via administrativa, com os principais países
produtores de petróleo a chegar a um acordo sobre cortes na produção, seja pela
via natural da eliminação de produtores com custos de exploração mais elevados,
a oferta diminuirá para se ajustar à procura, fazendo com que o preço do
petróleo suba. Tal apenas não sucederá se a procura aumentar de forma a
corresponder aos atuais níveis de produção, no entanto, não acreditamos que tal
venha a suceder.
Em qualquer dos
cenários, e ainda que no curto prazo o preço do petróleo possa estar sujeito a
pressões adicionais, no longo prazo, é razoável admitir que o preço de
equilíbrio se situe acima dos atuais níveis.
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